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Isto de discutir as praxes é giro, e tal, mas se formos contar o número de posts e comentários que o tema já provocou por essa blogoesfera fora, e se compararmos esse número com os posts e comentários provocados por qualquer outro assunto (até a morte de Eusénio!), não teremos de concluir que estamos a violar flagrantemente o sagrado princípio constitucional da proporcionalidade? Não será altura de o Tribunal Constitucional pôr mão nisto?
... que não livros.
Espero que me perdoem esta desfaçatez!
Mas andei a comentar em poiso alheio (um poiso que me parece muito bom, já agora).
Este problema do falhanço da massificação do ensino é complicado... Não me parece que tenha falhado (pelo menos se entendermos "falhar" como "mais valia não ter acontecido") — e não me parece por razões parecidas com aquelas que explico neste outro post sobre a razão porque acho que se lê mais hoje em dia, apesar do que se diz.
Sim, em média, os jovens que estão hoje na escola têm piores notas e são mais mal informados do que os jovens que estavam na escola há 50 anos. Porquê? Principalmente porque havia uma pré-selecção. A motivação para o estudo de quem ia para a escola era outra, porque o ambiente familiar de famílias muito seleccionadas de há 50 anos era melhor do que o ambiente das famílias portuguesas todas de hoje em dia.
Mas, nem o número de famílias com "bom ambiente" diminuiu (antes pelo contrário), nem o nível educacional dos portugueses em geral foi por água abaixo (muito pelo contrário). Se fizermos uma experiência mental parecida com a do meu outro post, veremos que, em 100 jovens portugueses escolhidos aleatoriamente (entre quem vai e quem não vai à escola), estamos muito melhor agora do que há 50 anos.
Ou seja, os jovens que estão hoje na escola têm formação pior do que os jovens que estavam na escola há 50 anos, mas os jovens em geral de hoje em dia têm uma formação incomparavelmente melhor do que os jovens em geral de há 50 anos.
Sei que é desesperante perceber que o bom ensino ministrado a umas quantas famílias (principalmente nas cidades) não pode ser espalhado por toda a população sem perder qualidade. Mas mesmo assim estamos melhor do que há 50 anos...
Reparem neste início de post d'O Arrumadinho:
Este discurso é típico — e necessário, porque uma das coisas que mais me irrita por essa internet é a forma violenta como todos andam a discutir, sem nunca saírem do casulo das suas próprias opiniões. Discutimos como se os outros fossem uns crápulas só porque não pensam como nós. Vamos lá ter calma...
Mas, vamos lá ver isto de forma um pouco mais fria.
Em relação à expressão [2], nada a dizer. Temos mesmo de respeitar os outros e o direito de expressarem as suas opiniões. Temos ainda de fazer o esforço de ouvir e considerar seriamente o que dizem, sem recusar à partida uma opinião que desconhecemos.
Em relação à expressão [1], aí já não concordo. Se temos determinada opinião, essa opinião não pode ser apenas expressão da nossa individualidade, como se fosse uma jóia ou uma roupa nova. Temos essa opinião porque achamos mesmo que é mais válida do que as opiniões concorrentes. Ou seja, ou bem que achamos que a praxe tem de ser proibida ou achamos que não — e normalmente temos argumentos racionais para sustentar a nossa opinião e devemos estar abertos a ouvir os argumentos dos outros e — aqui a porca torce o rabo todo — devemos estar disponíveis para mudar de opinião se, racionalmente, chegarmos à conclusão que devemos mudar de opinião — caso contrário, os nossos debates são uma conversa de surdos (bem, presumo que os surdos conversam tão bem ou melhor do que nós, mas, enfim, aqui fica a expressão corrente).
Sim, é verdade, isto não tem nada a ver com o que acontece quase sempre. Normalmente, uma pessoa arranja uma opinião e nunca mais a larga, como se aquela opinião fosse parte do seu ser e mudar de opinião fosse algo inconcebível — e normalmente um debate é visto como algo violento, porque os outros estão a tentar mudar a nossa querida opinião, já viram isto? ("Deixem-me lá sossegado com as minhas opiniões, por favor!")
Sim, não tem a ver com o que acontece, mas é o que acho que devia acontecer. É a minha opinião, lá está...
Não se enganem: respeitar a opinião dos outros não é dizer que essa opinião vale tanto como a nossa. Se calhar até vale mais (o outro pode ter razão). Mas se duas opiniões são incompatíveis, temos duas hipóteses: uma delas está errada ou estão ambas erradas. Mais vale procurarmos qual é o caso, em vez de dizermos que são ambas válidas (o que é válido é o direito de todos a expressarem a opinião, válida ou não — duas opiniões incompatíveis não podem ser ambas válidas).
Não se me expliquei bem... E se concordam...
Já vos disse que isto é um vício... De tal forma que consulto o site dos blogs do Sapo com mais frequência do que me atrevo a confessar...
Ora, olhando para as tags em destaque hoje, fica a dúvida: vai haver um referendo às praxes?
Brincadeirinha...
Mas, agora a sério, no meio desta discussão toda, não tenho certezas, mas posso dizer uma ou duas coisas:
1. O que vem a seguir a uma tragédia não é a melhor altura para discutir com cabeça seja o que for. Mesmo que os alunos estivessem envolvidos numa praxe no momento da onda que os matou, não foi a praxe que os matou, mas a onda... Por outro lado, chamar a atenção para alguns aspectos escondidos da praxe (pelos vistos tem de ser assim, no singular) só pode fazer bem.
2. A praxe é uma coisa que a mim não me assiste. Não gosto do ambiente. Só pratiquei uma vez e consistiu em cantar uma música dos Excesso e em ter umas letras pintadas na cara, o que não é praxe não é nada... Tudo o que tenho visto arrepia-me, mas também sei como é a análise selectiva das coisas praticada pela imprensa a mais das vezes. Por isso, alguma ponderação antes de desatar a querer proibir coisas, por favor.
3. Dito isto, parece-me estranho que um conjunto de jovens chegados à universidade declarem amor absoluto à Praxe e falem da diga cuja como se duma religião de tratasse (com padres-duxes e tudo). Amor ao conhecimento talvez fosse melhor (já estão todos a rir?), embora seja capaz de promover menos integração (um valor que pelos vistos anda a faltar aos jovens caloiros, que só com esterco se integram). Diria que uma noite de conversa integra muito mais, mas pronto. Ou até uma noite de bebedeira, sem esterco à mistura. Mas ficam lá com a bicicleta. (Como estamos a falar de praxes, se calhar é sem selim.)
Vivemos num país livre, até para estas coisas parvas. Convém é assumirmos a liberdade também para dizer não. Em resumo: acho que não se deve proibir a praxe (não podemos proibir tudo o que nos irrita), mas aos caloiros digo: não vão nessa cantiga. Limitem-se a brincadeiras e esqueçam a humilhação e tradição, que há coisas mais interessantes no mundo.
Foram os meus dois cêntimos para a conversa...
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