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Já que hoje estamos numa de Pinker, fiquem com um gráfico do livro The Better Angels of Our Nature:

 

 

E olhem que a explicação que ele dá para isto (também) tem a ver com livros.

 

O que me têm a dizer sobre isto?

publicado às 17:40

No livro de que vos falei há pouco, há esta nota de rodapé magnífica:

 

 

[...] A esos dos hechos un filósofo podría añadir otro, menos circunstancial y quizá más profundo: la creciente capacidad de insatisfacción de los seres humanos, fruto paradójico de la creciente capacidad de las sociedades occidentales para satisfacer nuestras necesidades. “Cuando los progresos culturales son realmente un éxito y eliminan el mal, raramente despiertan entusiasmo —escribe Odo Marquard—. Más bien se dan por supuestos, y la atención se centra en los males que continúan existiendo. Así actúa la ley de la importancia creciente de las sobras: cuanta más negatividad desaparece de la realidad, más irrita la negatividad que queda, justamente porque disminuye.” — Javier Cercas, Anatomía de un instante (2009), p. 432. (negrito meu)

 

Ora, pensem lá: não será isso mesmo que leva a que o mundo tenha melhorado de forma inacreditável nos últimos 200 anos, mas a indignação pelo estado do mundo seja cada vez maior? O paradoxo, de que pouca gente se dá conta, também se verifica quando alguém diz: “isto não devia acontecer em pleno século XXI” como prova de que as coisas estão cada vez piores. Ora bem, esta frase implica que o século XXI é, de alguma forma, melhor do que os anteriores (se não o fosse, não teria lógica indignarmo-nos por “isto” acontecer neste século em particular). E, no entanto, a pessoa está a tentar provar que estamos cada vez pior…

Seja como for, concentrarmo-nos no que é negativo não deixa de ser uma boa forma de irmos acabando com o que é, de facto, negativo. O problema surge quando nos concentramos tanto no negativo que esquecemos o que já temos e acabamos por ficar desesperados, sem forças para continuar — o que leva ao risco de aceitarmos soluções tão fortes ou radicais que pomos em causa o muito de bom que se conseguiu.

Em Portugal o problema nem é que nos concentremos demasiado no que há de negativo (que pode ser muito, não é esse o caso), mas que achemos tudo, à partida, mau, perdendo a capacidade de discernimento. Achar que tudo é mau acaba por ser o mesmo de achar que tudo é bom. Não saímos do mesmo lugar nem fazemos o esforço de perceber as coisas. Ou andamos desesperados “no pior país do mundo” ou encantados com “o melhor país do mundo”. Como está tudo no mesmo saco, ninguém repara quando alguém faz alguma coisa de realmente bom.

 

Depois, basta alguém não concordar com o nosso critério sobre o que está bem e mal para termos mais uma prova de que tudo está mal…

publicado às 19:08

O pessimismo é necessário e tem a sua utilidade (principalmente no que toca à nossa vida pessoal), mas enquanto forma abrangente de ver o mundo é tão enviesado como o optimismo. Por outras palavras, se virmos o mundo, à partida, de forma pessimista arriscamo-nos a errar tanto como se o virmos, à partida, de forma optimista. A solução é um pouco de rigor científico: podemos ter as hipóteses que quisermos, mas convém testá-las, ou seja, tentar ver se afinal estamos errados.

 

Veja-se este post. As preocupações são legítimas e normais. Mas algumas afirmações do texto citado são casos típicos de tremendismo. É saudável perguntarmo-nos se não serão exageradas... (E, coisa que também devia fazer, convém ir atrás de números e estatísticas, para não ficarmos enredados em ideias vagas.)

 

"Há anos que as nossas crianças não são educadas por pessoas. Há anos que as nossas crianças são educadas por ecrãs."

 

Bem, não exageremos. Não quero que os meus filhos passem a vida agarrados ao ecrã, mas o que vejo nos meus sobrinhos, nos meus irmãos e em mim mesmo que não sou tão velho é muita brincadeira, muita escola, muito contacto pessoal. As nossas crianças não estão a ser educadas por ecrãs. Há professores, há pais, há irmãos, há amigos. O contacto humano continua aí, de boa saúde — os pais que andam atrás dos filhos nas milhentas festas de sábado à tarde sabem-no bem.

"E o vidro não cria empatia. A empatia só se cria se, diante dos nossos olhos, tivermos outros olhos, se tivermos um rosto humano. E por isso as nossas crianças crescem sem emoções, crescem frias por dentro, sem um olhar para os outros que as rodeiam."

 

Também não vejo as crianças a crescer frias por dentro. Pelo menos, os meus sobrinhos de 5 e 8 anos, que vêem muita televisão, jogam muito computador e brincam muito um com o outro e com os amigos, não são nem frios e não estão sem olhar para os outros. Das muitas crianças que vejo, vejo pouca frieza...

"A escola, hoje, serve para tudo menos para estudar."

 

Que escolas são essas onde não se estuda? Nas que eu conheci e conheço, estuda-se muito. Sim, já ouvi muitos professores queixarem-se do mau comportamento dos alunos e da violência e de tudo isso. Mas vejo que a maior parte dos professores que conheço não desiste — e muitos alunos continuam a estudar, a trabalhar e a conseguir ultrapassar os problemas que têm. Talvez sejam uma minoria: mas alguma vez não o foram?


"A casa, hoje, serve para tudo menos para dar (as mínimas) noções de comportamento."

 

Depende da casa. Será que os jovens são mais brutos e mal-educados do que os jovens de há 50 anos? Estou só a perguntar. Pensem em termos estatísticos: escolham 50 jovens ao calhas no país de há 50 anos: aldeias, montes, serras e cidades. Depois escolham 50 jovens ao calhas no Portugal de hoje. (Claro que isto é uma experiência mental.) Se calhar, não há assim uma diferença tão grande, excepto na formação: os jovens de hoje estarão bem mais preparados. Afinal, os jovens de há 50 anos emigravam para fazer o que sabemos e os de hoje emigram para fazer outras coisas... (Infelizmente, uns e outros têm de emigrar, mas isso são outras histórias.)


"E eles vão continuando a viver, desumanizados, diante de um ecrã." 

 

Mais uma vez, não acontece isto com as crianças que conheço. Sempre houve tímidos e introvertidos que preferem desolhar os outros. Mas em geral as crianças continuam muito humanas. E a empatia, pelos vistos, até nem está a diminuir...

 

Desculpem, mas estas críticas, por vezes, fazem-me lembrar quem me dizia, há muitos anos, para deixar de ler tanto e brincar mais. Nunca senti que brincasse pouco. Mas, claro, é sacrilégio dizer isto. Não se preocupem: eu sei que ler é muito melhor do que ver televisão. Eu sei, eu sei...

 

*

 

Encarem isto como uma crítica construtiva: sim, há razões para preocupações, mas em vez de tremendismo, convém olharmos para tudo com alguma perspectiva e tentando contrariar, por princípio, as nossas próprias ideias, para não ficarmos enredados em declarações vagas, que não ajudam ninguém em concreto.

 

Afinal, a resposta a muitas das coisas que digo acima será: "mas basta olhar em volta!" — não, não basta. O espírito crítico e científico é isso mesmo: tentar perceber as coisas para lá das aparências do "olhar à nossa volta".

 

E não me interpretem mal: temos de nos preocupar com os nossos filhos, de facto. Não porque estejam desumanizados, mas porque convém incentivar a curiosidade, o espírito crítico, a diversidade de interesses, a empatia, o olhar pelos outros, etc.

 

(E, sim, cinco horas de televisão por dia é um problema concreto e individual...)

 

 

publicado às 15:34

Se tomarmos como adquirido que os jornalistas vão à procura do que é extraordinário e não do que é banal, temos duas hipóteses:

 

a) Os acontecimentos normais e banais são, em geral, positivos e as notícias dos jornais tenderão a ser negativas e a mostrar o que está mal (que será a excepção).

 

b) Os acontecimentos normais e banais são, em geral, negativos e as notícias dos jornais tenderão a ser positivas e a mostrar o que está bem (que será a excepção).

 

Qual destas teorias estará mais próxima da realidade?

 

Resposta tipicamente portuguesa: "O mundo, não sei. Mas em Portugal, tudo é mau e as notícias mostram o que é pior ainda."

 

(Hoje estou numa manhã dada a estas reflexões. A gerência pede desculpa.)

 

 

 

publicado às 10:50

Francisco José Viegas diz que "a leitura [é] cada vez mais uma atividade minoritária". 

 

Este é o discurso habitual dos tipos de Letras, nos quais me incluo, orgulhasamente (tem dias).

 

No entanto, não consigo dizer que concordo.

 

Não tenho dados concretos (hei-de os procurar). O que posso fazer é pedir-vos para fazerem uma experiência mental: imaginem o país actual e imaginem ainda que escolhe, aleatoriamente, 100 jovens de 16 anos. Vamos encontrar um número determinado de jovens que gostam de ler.

 

Agora façam o mesmo exercício para o país há 10, 20, 30, 40, 50 e 60 anos. Em qual destes Portugais imaginam encontrar mais jovens de 16 anos que se considerem leitores? 

 

Não se esqueçam que a escolha dos jovens é aleatória. Não são jovens na escola, não são jovens das cidades, não são jovens do Norte ou do Sul. São 100 jovens portugueses, aleatórios. Das aldeias, das vilas, das cidades, de todas as famílias.

 

O que me parece, sinceramente, é que a percentagem terá vindo a aumentar ao longo das décadas. 

 

Porque digo isto?

 

Porque conheço muita gente que gosta de ler cujos pais e avós liam pouco ou nada. Conheço menos gente que não goste de ler e venha de famílias onde isso era uma tradição.

 

Isto não quer dizer que alguém habituado a falar, por exemplo, com jovens universitários não sinta uma diminuição do interesse pela leitura. Porquê? Porque o grupo dos jovens universitários alargou-se de tal forma que inclui hoje pessoas de origens muito diversas em relação aos jovens quase pré-seleccionados de há alguma décadas.

 

Mas, mesmo assim, há sempre um núcleo duro de leitores que não tem vindo, quanto a mim, a diminuir.

 

Como em tudo, temos de ver as coisas concretamente. Hei-de procurar os dados e vamos falando deste assunto.

 

(Outro assunto será o que se lê. Mas fica para depois.)

 

publicado às 19:22


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