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DICIONÁRIO DE PALAVRAS PERIGOSAS: RESPEITO, OPINIÃO.

woodtype-846089_640Bem, não. Acho que tenho de respeitar o direito que todos temos de ter opinião. E ainda respeitar as pessoas, o que implica demonstrar a nossa discordância sem ataques pessoais. Mais ainda: podemos respeitar-nos a nós próprios pondo em cima da mesa a hipótese de estarmos errados. Ah, o franco debate de ideias, sem picanços nem insultos. Será possível? Não sei. É difícil. Custa muito. Mas não me parece impossível. Reparem agora nisto (é um exemplo extremo): seja lá qual for a opinião que leva um tarado a matar 50 pessoas por serem gays, será bem pior do que a ideia simples de que devemos respeitar a vida dos outros. As pessoas, meus amigos, as pessoas concretas valem muito mais do que uma qualquer opinião. E as opiniões contrárias a esse valor de cada um não me merecem respeito algum.

Há pouco, pelo Facebook, encontrei quem perguntasse «a libras é uma língua a sério?».

 

Ora, o que é a libras? É a língua brasileira de sinais. «Língua de sinais» é a expressão brasileira para o que nós chamamos por cá de «língua gestual».

 

Houve logo alguém que disse: «Não,  não. Não é uma língua! É uma linguagem.» (Não sei bem o que queria ele dizer com isto…)

 

A outra pessoa ficou mais descansada, até ao momento em que me meti na conversa e disse que, na verdade, a língua brasileira de sinais e, por cá, a língua gestual portuguesa são línguas mesmo a sério. São manifestações da linguagem humana tal como o português, o inglês e todas as outras línguas que conhecemos.

 

Senão, vejamos:

  • dicionarioAs línguas gestuais têm gramática própria. Têm sujeitos, predicados, verbos, complementos e tudo o mais que conhecemos das gramáticas das línguas orais. Têm também dicionários e gramáticas, claro está.
  • As línguas gestuais não são meras transposições das línguas orais que se falam em cada país. Assim, a língua gestual portuguesa está mais próxima da língua gestual da Suécia do que da língua gestual brasileira. É estranho, mas é assim. A gramática da língua gestual portuguesa não é baseada na gramática do português.
  • Podemos criar frases de forma criativa e até, claro, criar poesia. É uma língua! Podemos fazer literatura com ela. Podemos dar instruções. Podemos seduzir e insultar. Podemos até usar uns quantos palavrões!
  • Há quem use estas línguas melhor ou pior. Há quem seja mais desenvolto a falar (neste caso, a usar os gestos) e quem seja um pouco trapalhão. Tudo como no caso das línguas orais.
  • Há variação regional e social e há uma norma-padrão.
  • Há mudança ao longo do tempo, tal como acontece nas línguas orais.
  • São línguas que podem ser reconhecidas oficialmente ou ignoradas por muitos — o que também acontece com as línguas orais.
  • Quem aprende a língua gestual portuguesa em adulto pode usá-la «com sotaque», ou seja, nunca conseguir ser fluente na língua como os nativos, ou seja, quem a aprende desde criança. E, reparem: é uma língua que é tão difícil de aprender para um português como para um inglês — isto porque não é baseada no português.

 

Em resumo: a língua gestual portuguesa é uma língua. Está até reconhecida na nossa constituição. É pouco conhecida e há quem ache que é uma simples «linguagem», como a «linguagem dos pp» ou algo assim, mas, na verdade — e repito — é mesmo uma língua a sério.

 

(Já agora, há uns tempos escrevi noutro lugar um texto sobre as 10 (!) línguas de Portugal.)


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