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Que o Pai Natal não existe acho que ele já desconfia… Até porque uns vêm dizer-lhe que é o Menino Jesus, outros falam-lhe só do tal Pai Natal e ele fica baralhado. Lá na cabeça dele já deve ter pensado: «se calhar quem compra os presentes são os pais e os avós — mas mais vale ir na brincadeira, que eles parece que gostam».

 

Portanto: não é isso que não quero dizer ao meu filho. Também não tenho medo de falar de temas mais pesados, como a morte, que ele já percebeu que existe, até porque a Disney faz o favor de matar não sei quantas personagens nos seus filmes, deixando o miúdo num pranto e nós sem saber o que dizer. É preciso matar tanto pai e tanta mãe das simpáticas criaturas daqueles filmes? São sádicos, os senhores da Disney?

 

Ora, também não será novidade para ele que neste mundo há gente cruel. Ou melhor, que toda a gente, de vez em quando, sabe ser má. Ele anda na escola: já encontrou a crueldade. E se calhar até já encontrou a crueldade mais difícil de todas: a dele próprio.

 

Agora, para lá dessas ilusões de Pais Natais e outros que tais, ele está convencido disto: que nós, os pais dele, até sabemos mais ou menos o que andamos a fazer e percebemos muito bem o mundo. Que sabemos protegê-lo de tudo e ajudá-lo a ultrapassar as dificuldades. E, é verdade, nós tentamos fazer isso mesmo — mas a verdade crua é esta: temos muito menos certezas e sabemos muito menos sobre o mundo do que ele pensa. Quando pegamos na mão dele para atravessar a estrada ou quando apontamos e explicamos o mundo sentimo-nos quase tão desorientados como ele.

 

Mais tarde ou mais cedo, ele vai descobrir isso mesmo. Espero que seja daqui a muito tempo, quando ele já conseguir orientar-se tão bem ou tão mal como qualquer um de nós. E estou convencido que ele ainda há-de descobrir isto: também os pais chegam a uma altura em que precisam que os filhos lhes peguem na mão e os orientam. Mas depois também eles descobrem que os filhos, tão espertos nestas coisas novas do mundo, na verdade também estão desorientados e lá porque sabem mandar um e-mail não quer dizer que saibam o que dizer a um pai ou a uma mãe quando a vida muda como uma casa num furacão.

 

Pois é: todos descobrimos que nesta vida amalucada não há ninguém que saiba exactamente o que fazer — mas não quero dizer isso já ao meu filho, porque o que nos vale ainda são esses primeiros anos em que os pais fingem estar a mostrar, sábios e antigos, o mundo aos filhos e os filhos brincam no mundo cheio de felicidade, numa viagem qualquer, a rir e a cantar, para ir descobrir a neve pela primeira vez.



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