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Às vezes (não devia, mas pronto) vou pequeno-almoçar perto do escritório, em vez do saudável pequeno-almoço matinal em casa, antes de sair. Mas não interessa. O problema é quando, por vezes, saio de casa com um livro e levo-o para o tal pequeno-almoço. Estou com a minha mulher à frente, mas todos sabem que um casamento saudável implica alguns momentos de silêncio comum, um folhear de revista ali, uma leitura acolá, um olhar para o telemóvel aqui, sob o olhar muito crítico de senhoras com um balão de pensamento por cima da cabeça onde vemos escrito "ai, estes jovens, sempre a olhar para o telemóvel". Portanto, estou com a minha mulher à frente, mas começo a folhear um livro (isto passou-se ontem).
Neste caso, o livro é o que vai abaixo, não nesta edição, mas sim noutra, de papelaria, que li há muitos anos.
Começo a ler vagamente, e de repente, é como se tivesse caído num precipício. Endireito-me na cadeira, atento mais na página, começo a ler com atenção.
O raio do livro é mesmo muito bom. De repente, estou a sorrir perante as invectivas contra a "cidade branca" que um distraído cineasta julgou ver em Lisboa, estou a sorrir ainda mais com o tigre inexistência da Mauritânia, estou deliciado a percorrer as apertadas ruas resvés o caminho-de-ferro de Entrecampos, a olhar para um edifício duma fundação habituada a engenharias fiscais, com uma sede pós-modernista que muito deu que falar na Lisboa da altura, tudo salpicado com muita ironia e apartes que não me deixavam largar o livro.
Deixo o pequeno-almoço para trás. A minha mulher termina e olha para mim. Eu continuo a ler. Ela levanta-se e paga. Eu continuo a ler. Ela olha para mim com cara de preocupação.
Lá tenho de cortar com o vício e levantar-me. Há que trabalhar. E custa tanto, com o livro ali ao lado, a chamar por mim.
Por isso, amigos, vão por mim: não levem livros para o trabalho. A bem da produtividade nacional!
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