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Chegámos aos 200 posts. Tenho de ver se abrando, que ainda ganho bloguite aguda.
Já agora, há um mês andávamos assim, a falar de relações carnais...
"Andei a ler o livro que recomendaste, o do Vonnegut. É por livros destes que não gosto de literatura: caraças, o mundo é terrível, vai tudo de mau a pior, e os argumentos que usa para chegar a essas conclusões não só são falaciosos, como são envolvidos numa nuvem de intensidade emocional e manipulação 'artística' que deixa os leitores abertos a aceitar um 'conhecimento' que é tão falso como a magia medieval. O senhor Vonnegut, por exemplo, pega na crueldade medieval como prova do terrível que são os humanos. Mas esquece-se de quanto evoluímos até aqui e a que violência e crueldade diminuíram muito. Claro que tu e os teus amigos da literatura devem dizer logo: 'mas será que evoluímos assim tanto? Não estaremos sujeitos a outras violências?' Não, pá! Estamos sujeitos a outras violências, mas bem menos violentas do que rebentar com pessoas usando cavalos. E podes encontrar exemplos de práticas dessas, que eu mostro-te logo a seguir todos os dados reais que comprovam a diminuição da violência. Podes falar das guerras e dos drones, mas digo-te que, à proporção da população actual, o impacto é muito menor do que a crueldade medieval. Mas vocês, pá, gostam muito do caso particular, da história exemplar, e usam sempre para chegar às mesmas conclusões: que a humanidade não presta, que a literatura ainda é o último reduto dos homens decentes, e mesmo essa está sob ataque. Se os números reais vos contradisseram, argumentam logo que o mundo de hoje liga demasiado a números. Ora bolas, se a realidade não vos servir hão-de dizer que o mundo de hoje é demasiado real, será? O Vonnegut, por exemplo, na tal obra cujo nome nem vou dizer, basicamente chega à conclusão que a humanidade não presta porque já não gosta de ler contos (os dele, presumo) como antigamente. Please..."
— J.D.
Se as estantes nos revelam ou nos deixam a alma um bocado nua, como disse num post desta manhã, o que farão as margens escritas dos livros?
Como acho que já vos contei há alguns dias, sou muito avesso a escrever nas margens.
Mas, por vezes, lá deixo a mania de lado e desato a rabiscar. É libertador.
Uma vez, caí no erro de emprestar um livro com essas marginalia muito minhas, cheio de exclamações, de dúvidas, de indecisões, de interpretações.
O amigo a quem emprestei, quando devolveu, disse-me que achou as notas terríveis, completamente erradas, sem ponta por onde pegar. O livro era muito bom, a minha leitura é que não prestava.
Fiquei pasmado: primeiro, pelo desplante dele em ler assim as anotações. Depois, pela forma como o mesmo livro é lido de forma tão diferente por duas pessoas.
Mas é assim a vida: somos todos leitores uns dos outros e raramente acertamos nas anotações que fazemos.
Falo de J. Rentes de Carvalho e começo a receber visitas internéticas da Holanda.
São só dois ou três gatos pingados que chegam aqui vindos do google.nl, mas tendo em conta que este é um blog recente e muito obscuro perdido aqui para um canto da blogoesfera portuguesa, isto só pode querer dizer que J. Rentes de Carvalho é mesmo muito procurado lá por aqueles lados, tanto que há holandeses que passam por páginas e páginas de resultados do Google até chegarem aqui a este canto.
Incrível!
Já pensaram bem que as vossas estantes são uma grande mostra de quem vocês são? Não há que enganar: os livros que compramos revelam muito do que somos.
Há até quem faça julgamentos tão sumários que uma biblioteca variada, bem mantida, muito lida não pesa nada em comparação a um livro errado numa das estantes. Há pessoas que avaliam os outros assim: e não é só com os livros… (Isto faz-me lembrar um conto do Eça. Alguém quer adivinhar qual é?)
Ora, na realidade, se quisermos fazer uma radiografia à alma leitora duma pessoa, tínhamos de fazer uma análise mais profunda: que livros comprámos e lemos? De que livros gostámos? Quais são prendas de outras pessoas que não nos conhecem assim tão bem? Que livros lemos e gostámos há alguns anos, mas agora já não são bem os nossos livros? E por aí fora…
As pessoas são oceanos com relevo muito complicado, e quem olha só para a superfície fica a ver navios.
Mas poucos resistem a essa tentação de olhar para os livros dos outros e tentar adivinhar a pessoa que ali se esconde...
Isto de discutir as praxes é giro, e tal, mas se formos contar o número de posts e comentários que o tema já provocou por essa blogoesfera fora, e se compararmos esse número com os posts e comentários provocados por qualquer outro assunto (até a morte de Eusénio!), não teremos de concluir que estamos a violar flagrantemente o sagrado princípio constitucional da proporcionalidade? Não será altura de o Tribunal Constitucional pôr mão nisto?
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